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    Crónica de Beja - 'Taurinismo, à parte de qualquer pedagogia'



    A Praça de Toiros José Varela Crujo, em Beja, testemunhou ontem uma jornada marcante e que ditará um novo rumo no futuro da Festa Brava por terras Alentejanas.

    Ao arrojo e dinâmica da empresa de Rafael Vilhais, há que congregar três vocábulos; dois de sentido real e já concretizado: mérito e notoriedade; e outro, que deverá ser fonte da vitalidade e renovação da festa, que para além da constância, deveria ser imprescindível no quotidiano taurino: repercussão.
    Toda a metodologia pela qual se deve reger um espectáculo de toiros foi respeitada e exultada com distinção e rigor.

    Há mais de 20 anos que a José Varela Crujo não esgotava. Em tertúlia, contam-me que o ambiente de ontem fez recordar saudosos tempos em que Mestre Batista, Núncio, D. Francisco Mascarenhas ou Paco Ojeda trouxeram a glória, a ilusão e fundamentalmente, a afición. Foi Beja de outros tempos, quiçá de outro campeonato que não o costumeiro por estas paragens. As bancadas da centenária praça pareciam querer explodir, o rugido foi mais alto que o habitual, o cimento pareceu ter molas que ocasionaram o júbilo. a alegria e satisfação do público. 'Pedro, foi a melhor corrida que vi nesta praça nos últimos 30 anos!', disseram-me. 


    Para além do triunfalismo, e que é viral quando se conjuga uma terna desta dimensão num ruedo com 'fome de toiros', a lição a retirar dos acontecimentos da noite de cinco de agosto de 2016 em Beja é somente uma: a exaltação ao taurinismo. 
    Aparte de qualquer pedagogia, de conceitos e regras que devem ser exequíveis (e atenção, nunca descuradas), ontem, o taurinismo resultou acima de qualquer tentativa pedagógica de incutir maneiras, pureza ou exigência. O caminho deve ser trilhado na sequência e vontade de quem paga, no interesse, no diferente e apelativo. 
    Não ouvi um único queixume, crítica ou reparo. A festa, do triunfo, do público e da glória colheu para si os louros, e o 5 de Agosto de 2016 ficará marcado em cada canto da Praça de Toiros José Varela Crujo, como o dia em que a tauromaquia no alentejo, mudou de rumo.



    O curro de António Charrua, no limiar da presença para o cartel em questão, desenvolveu matizes idênticas e suficientes para o toureio praticado pela terna. Bondade em detrimento da transmissão, classe num galope cadenciado e fácil, com tónica acentuada na toureabilidade. O quarto e sexto revelaram maior fiereza, embora sem fijeza e com menor predisposição no final. O sétimo, de Brito Paes, com três anos, foi manso, sem teor e que pedia sapiência e ligação. 


    Rui Fernandes andou a gosto frente ao primeiro Charrua, castanho com 480Kg e de perfil anovilhado, a carecer de seriedade, sem estar sobrado de força e com falta de vida, revelando nobreza a perseguir a montada. Fernandes esteve por cima, envolvente na brega e a procurar acerto na cravagem, com destaque para o terceiro curto, atacando de forma vibrante e cobrando com ortodoxia, e para o último, cravando com som e com o público do seu lado.
    O quarto de Charrua, a investir a cabezazos no capote, com maior disposição e vontade, viu-se dificultado para ganhar sítio, e Fernandes teve que pisar os terrenos certos para dele extrair matéria. 
    Novamente com ritmo na brega,  mas sem romper com a mesma força na ferragem, a actuação caiu de tom, logrando, todavia, um par apertado e de boa nota no corredor.


    Grande parte (se não a maior) da enchente registada ontem em Beja deveu-se à presença do rejoneador luso-espanhol Diego Ventura. 
    Com uma quadra que elevaria a figura muitos dos cavaleiros portugueses, o rejoneador radicado em Puebla del Río logrou a mais sóbria e redonda actuação da noite.
    O seu primeiro oponente, colorau (como a maioria do curro), feio e chato, com 490Kg teve o condão de ser nobre e repetidor, demonstrando-se tardo e com falta de prontidão. Ventura denotou regularidade nos compridos (verificada em ambos oponentes do seu lote), para nos curtos, e montando Nazarí, conseguir os melhores momentos de toureio da noite. Toureio templado e com sentido, com brega de nível e bem medida, reunindo com eficiência e acerto. Rematou a sua actuação com três violinos de palmo e um par, mais populista e menos cingido, mas que resultou como uma bomba nos tendidos. 
    O quinto, animal alto e esguio, algo cuesta arriba, pedia um toureio encimista e de muita ligação. Noblón e sempre a trote, valeu um arrimón a Ventura, que voltou a mostrar intenção mas menor sequência. Com o Remate entusiasmou nos momentos procedentes à ferragem, com desplantes (quiçá excessivos) ousados na cara do animal. Terminou com toda a praça completamente entregue a si, apeando-se da montada e sendo tributado com uma enorme ovação.


    Filipe Gonçalves, moralizado pela agradável campanha que tem feito, esteve decidido e muito disposto frente ao terceiro Charrua da noite, alto e largo, com 610Kg, com pouca cara e de jogo fácil e algo desluzido, tapando-se um pouco no momento da reunião e acabando por não romper. As ganas e vontade do toureiro valeram pela do oponente, logrando uma actuação difásica e com duas vertentes: a primeira fase de curtos resultou com uma importância de salutar, procurando o embroque ajustado e medido, com o morrilho debaixo do braço; posteriormente, deu lugar a um toureio de maior impacto, com o 'Chique' a bater palmas, terminando com um violino em palmo de colocação mais diminuída. Fechou uma primeira parte agradabilíssima para o conclave. 
    O sexto saiu com maior gás, e no início colheu de forma feia e aparatosa o cavaleiro, que se dobrava em curto para a preparação da sorte. Montada e cavaleiro no chão, que prontamente foram acudidos por colegas e gente na teia. Após o susto, e um brinde a Rafael Vilhais (noite em que o empresário havia sido brindado também por Ventura e posteriormente por Joaquim Brito Paes), montando o Universo, os momentos que mereceram apunte verificaram-se na brega, com ladeios muito em curto e desafiando o oponente. O terceiro curto, atacando com batida e corrigindo a investida do toiro no último momento, resultou com maior visibilidade, deixando para trás uma série em que a investida do oponente ficou um pouco desviada do centro do domínio da sorte. 


    O amador Joaquim Brito Paes, toureando já tarde e fora de horas, teve pela frente um novilho bem apresentado mas de jogo complicado e pouco claro. Andarilho, a revelar sonsería e mansidão. Pela frente pedia-se um toureiro sapiente e curtido, algo que o jovem Brito Paes poderá ser no futuro. Os erros, tão usuais nesta fase, devem ser suplantados pela vontade e disposição, e isso são atributos que se reconhecem ao jovem toureiro. A sesgo e sem se dar por vencido, logrou dois ferros de nota salutar. 

    A corrida foi dirigida com acerto e correção por Agostinho Borges, abrilhantada pela Sociedade Filarmónica Capricho Bejense.

    A memória irá perpetuar a imagem do cartel, e o ambiente de uma noite que marcou a cidade de Beja.

    Pedro Guerreiro




    NOTA: A análise às prestações dos Grupos de Forcados, serão feitas num post à parte.